28 de março de 2013


"Dexter,
Li um livro esses dias que dizia, em uma frase destacada, “se as pessoas fossem chuva, eu era a garoa e ela, um furacão”. Chamou minha atenção, e, admito, fiquei pensando sobre isso mais tempo do que deveria. Mas a verdade inegável é que seu nome me veio na cabeça, D. Olhei para aquela antítese clara e pensei em você diretamente. Se as pessoas fossem mesmo chuva, o que seríamos nós? Você nunca chega de mansinho, e nem dá avisos de que vai chegar. Mas eu também não. Você tem uma voz calma e rouca, daquele tipo que ninguém dá nada até ouvir berrar com toda força monumental de pulmões infalíveis que nada nessa vida é maior que você. E eu devolvo dizendo que existe sim coisa maior. Eu te mando olhar para o céu azul que não prevê o que está por vir. Para o oceano cheio de lágrimas de amores perdidos. Não quero que você observe a água, Dexter. Quero que veja os amores perdidos. Toda a tristeza desperdiçada por algo que alguém pensou que durasse para sempre. Amor não dura para sempre. Nós somos maiores que o amor, infinitamente maiores. Criamos a sensação de amar alguém, e por termos essa capacidade gigantesca de dar vida a algo inexiste, somos maiores do que aquilo que criamos. Só que jamais, em hipótese alguma, venceremos aquilo que sentimos, Dexter. E o único sentimento verdadeiro é a dor.
Não somos maiores que a dor, D. Por isso somos tempestade, não arco-íris. Por isso somos o cinza frio numa noite de inverno, não as nuvens brancas de uma tarde de verão. Somos o desespero irrefreável de um desejo extremo e mortífero, sangrando internamente e destruindo órgãos. Somos os ventos que cobrem cidades e desabam famílias. Se as pessoas fossem chuva, como Miles pensava que fossem, nós seríamos uma tempestade indomável, Dex. Nós daríamos as mãos e, juntos, acabaríamos com um continente num piscar de olhos, sem ter medo de algum dia precisar voltar atrás. Sei que sou medrosa, mas ao seu lado a história sempre foi outra. Você me deu a força para me erguer, você me tirou das cinzas e não me deixou retornar ao pó. Com você, eu moveria montanhas sem sair de casa. Eu tinha esse poder, juro que tinha. Se eu fosse tempestade, você era o meu céu negro e sem estrelas. Você era meu infinito perpétuo que não deixava a luz chegar, prolongando o meu reinado de horrores. E em mim, mesmo com todos os pingos caindo enlouquecidamente e raios amedrontando a multidão, você enxergou beleza. Você nunca procurou, mas encontrou nos meios gritos mudos a mesma dor que havia em seus pulsos cerrados.
Acho que, no final, nós nunca fomos feitos de amor. Não existimos com o propósito de receber e devolver falsas esperanças, e por isso não estamos mais aqui. Você nunca acreditou em mim, eu nunca acreditei em você. Sempre pensei que fosse passar, mas no fim não passou. Não ainda e não nunca. Aconteceu o que a gente não esperava que fosse acontecer, Dex: saudade também é dor. E eu não sei lutar contra gigantes quando você não está ao meu lado. Nunca te amei. Nunca te quis por perto tempo o suficiente para te amar. Você não me deixa nas nuvens e definitivamente não me faz ver borboletas. Você me dói, Dexter. Você faz arder cada centímetro do meu corpo, e isso é o que mais me assusta. Eu te sinto o tempo todo. Eu pego seu perfume no ar. Você se tornou aquilo que jamais esperei: falta. Hoje eu não comemoro mais os meus aniversários comentando o quanto a sua presença me estressa, mas o quanto sua falta me deixa no chão. Você me tirou do pó para me tornar dor. Me fez levantar apenas para ter o prazer de me ver no chão de novo. Não quero mais sentir isso, Dexter. Estou cansada de ver seus olhos no espelho e desejar ardentemente ser maior do que tudo nesse mundo. Estou numa batalha contra titãs, D, e certamente vou perder. Imploro pela minha sentença final, mas descubro que é só isso: todos os dias, terei que me levantar sabendo que enfrentarei mais criaturas horrendas enquanto carrego você no peito. Todos os dias eu vou doer. Eu nunca tive muita coisa, Dexter – mas, preciso confessar, tinha um pouco de fé. Sempre pensei que as coisas melhorariam uma hora ou outra. Eu tinha medo. Me apavorava o fato de, algum dia, precisar trilhar essa caminhada sozinha. Eu tinha falta de ar. Tinha anseio. Tinha aquele pavor natural ao perigo. Tinha você.
Agora, eu não tenho nada.
Se as coisas já estavam difíceis antes, D, imagine agora. Sinto como se não houvesse nada nesse mundo capaz de impedir minha tempestade de desembrulhar. Vejo meus trovões soando por aí, mas ninguém parece capaz de escutar. E isso não me deixa mais triste. Vou por esse mundo abaixo e não me importo com os efeitos colaterais. Eu sou o efeito colateral de todas as maldades do universo. Eu sou a maldade em pessoa. E você, com essa posse sobre todas as divindades do mundo, não deixou nada para mim. Eu não posso ser salva. Nunca quis te dizer isso, mas essa é a verdade. Nada mais me deixa triste, nada mais me faz chorar. Falar em você não me causa a mesma pontada no peito que causava antes. Eu não tenho nada a perder, Dexter, e esse é o mais fundo que qualquer pessoa pode chegar. Não tenho mais palavras que descrevam o tamanho do que eu sinto, pois até mesmo o infinito se cansa de continuar. E uma hora acaba. Gostaria de ser capaz de lhe passar palavras bonitas e cheias de incentivo, que pudessem tirar você de seu próprio poço e fazer você brilhar mais uma vez. Mas a verdade é que qualquer traço de luz me foi arrancada. As estrelas não permitem um brilho maior que a delas, Dex. É isso que faz o ar chegar aos meus pulmões errantes. Saber que, talvez, eu pudesse brilhar tanto quanto uma constelação me faz ficar de pé, de vez em quando. Às vezes eu ainda caio, mas com você não precisa ser assim. O universo só sentiu inveja de você. Não diga que não tem nada, D – você sempre teve a mim.
Se as pessoas fossem chuva, Dexter, ambos seríamos tempestades. Eu cairia no oceano e transbordaria as lágrimas esquecidas, relembrando o mundo de todas as desgraças existentes que já foram enterradas. Você, por outro lado, seria o dilúvio do deserto – trazendo esperança em sua raridade, carregando luz mesmo na maior escuridão. Essa é a nossa diferença.
Com amor,
Eu."
- Se as pessoas fossem chuva, eu seria você. Ana F.

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